terça-feira, 19 de agosto de 2025

o tempo de uma vida em uma noite.

 (ao que parte);


as iniciais talhadas no mogno estavam desgastadas pelo tempo. um pequeno mas bonito musgo, verde cintilante, crescia por entre as pequenas rachaduras do corpo. 


seus dedos desentrelaçaram dos meus, e eu me despedi do mundo. 


no bolso, a pequena caixa dos mistérios trocados, arrumados com carinho. uma coleção de palavras doces, uma fotografia dos seus olhos e três beijos, pra usar quando a saudade estrangular o peito.


Fomos cada estrela desse céu. 

matamos dragões,

construímos em barro o alicerce de nossa casa

e florimos com sangue nosso jardim.


e eu te amei até o osso! 


quando sua boca desencontrou da minha,

choveu. nos soterramos em argila e sonhos.


entre os escombros,

de malas prontas, nos passo um café.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

o caso é que, como Capricórnio,
criei vínculos com todas as estradas
em que passei.
cada pedra rolada dão firmamento.

há pedaços de mim 
por cada cidade que morei.
gostaria de ocupar todos os espaços ao mesmo tempo,
clepsidra distribuindo as horas.

re-
beijar cada boca,
dormir cada cama,
moer cada vida.

quarta-feira, 17 de abril de 2024

hoje eu chorei na rua; e

imediatamente

o céu fez companhia e desaguou comigo.

talvez para me ajudar a enganar os que passavam,

talvez para lavar aquelas lágrimas

que já não fazem mais poesia. 


quantas ameaças ainda precisam ser vencidas?

hoje eu chovi na rua; e 

imediatamente

o céu fez companhia e chorou comigo.


eu voltei. agora mais fraco que nunca.

terça-feira, 18 de agosto de 2020

De todas as flores no campo, colhi a mais adornada de espinhos. A dor pungente de cravejar o belo, aperto-a com força entre os dedos pra não perder seu perfume. 


Rego com sangue o solo da próxima Primavera.

Teus olhos são como sol do meio dia

Canto de sabiá tecendo melodia.


Te amo como o abrir das flores aos pássaros. Mel de pitanga no bico do araçá.

terça-feira, 11 de agosto de 2020

Eu gosto de você. Talvez mais do que seria sensato gostar. Mais do que é permitido. Além do profano, dos lençóis, e além do que escondo apertado na palma das mãos. Te amo como o amor que devoto aos astros: sem explicação, sem sentido, mas ainda assim amor. Amor pelo vesúvio sobre meu corpo, o cataclismo em meu ossos. Amor dos olhos da Lua e dos deltas de Vênus.

Te beberia dois oceanos pra lhe colher os Peixes. 

sexta-feira, 19 de junho de 2020

então
eu gosto de você.
gosto de um jeito novo, de um significado não experimentado. gosto do jeito que se gosta do sabor do café. gosto de como quem arde o lábio e assopra pra doer de novo.

gosto de doer a garganta.

gosto como quem gostaria da ressignificação do gosto. do entregar-te novo.





[gosto], como quem nunca teve o que comer.

quinta-feira, 5 de setembro de 2019

polinizado;

desde seu último beijo
tenho você atravessado em minha garganta
e fincado no meu peito.

todas as cores são suas,
todas as palavras são você.

sinto correr pelas minhas veias
o perfume de seus ramos
e brotar em meu peito
o lírio de seus olhos.

teu nome floresce em meus ouvidos.
minha boca é sua flora.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

certa vez
alguém escreveu num pedaço de papel velho
o que era certo
o que era errado
e todo mundo acreditou.
e todo mundo mentiu pela verdade
todo mundo matou pela verdade
e todo mundo queimou na fogueira pela verdade
e as ervas foram proibidas
e as maçãs perderam seus sabores
e o prazer se cobriu de medo
o sangue virou veneno.
os anos abaixaram as cabeças
curvaram as costas
corroeram os dentes
açoitaram a pele
enferrujou as vísceras.
Deus matou mais que Hitler
e todo mundo se calou.
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Mas dos escombros de vossos castelos
nos erguemos em fúria
e vocês se cagam de medo
em seus tronos de ferrugem sangue e osso
vocês entram em pânico:
querem salvar a família que vocês traíram
querem amar os filhos que vocês cuspiram
querem abraçar as mulheres que espancaram
querem proteger as vidas que vocês tiraram
querem o amor que vocês entregaram pra guerra
vocês fizeram amor com a guerra
e deram vida a morte.
vocês querem salvar o mundo de nós
mas nós somos a salvação:
nós carregamos as 7 trombetas no pulmão
somos saqueadores da moral,
os destruidores da ordem
nós somos o juízo final

sábado, 18 de novembro de 2017

a dor inunda o peito
procura se agarrar
escorre pelos olhos
e volta pela boca

a dor inunda o peito
a procura de alguma palavra
qualquer coisa que possa tornar o silêncio
poesia

a dor inunda o peito
e se percebe sozinha.
a dor chora a ausência

não há cheiros
não há carícias
não ha nada além de fotografias espalhadas pelo chão.

a dor turva as lembranças
e se afoga em si mesma.